Seria um dia normal, como qualquer outro, não fosse o
encontro casual com uma garotinha ousada, falante e linda, num dia frio e
chuvoso.
Na verdade fui eu quem a provoquei...
Cheguei ao ponto de ônibus como de costume e constatei que
não encontrei as mesmas pessoas e acho que pelo próprio costume, me vi sentindo
falta delas... Estava ali: eu, um garoto e a garotinha ousada, falante e linda,
quando quase acidentalmente, perguntei a ela:
- Onde foi parar todo
mundo hoje? E ela com um sorriso largo
no rosto, desembestadamente, começou a falar:
- Acho que não saíram de casa por causa da chuva, eu mesma
não deveria estar aqui se não fosse a minha prova de português, pois tenho
sinusite e minha mãe me deixa em casa toda vez que o tempo muda assim...
Achei-a no primeiro momento falante demais, mas não parou por
aí, logo continuou:
- Você conhece um menino que se chama Rafael Sato?
- Não, respondi a ela... E logo ela respondeu:
- Você tem cara de quem é amiga do Rafael Sato, por isto
perguntei... Por que você conhece outro garoto que conhece ele, pois te vi
conversando com ele dia destes aqui.
Pude perceber neste momento então que estava sendo observada
por ela há alguns dias e nem tinha me dado conta disto... Eu, parada ali,
olhando atentamente aquele rostinho dócil, meigo e astuto, pensei: Não me
lembro...
Mas ela prosseguiu insistindo, até que minha memória me
revelou o tal menino: Era o Mateus, meu sobrinho... Após minha revelação a tal garota,
presenciei um suspiro seguido de um: Eu amo o Mateus! (Esta frase parecia
representar a ela uma revelação bombástica, algo sério, temível, que ela
entregara ali a mim, assim: de bandeja e com algum acréscimo: Sou muito nova pra
ele e ele nem sabe que eu gosto dele, na verdade, ele conhece mesmo a minha
irmã, que é a namorada do Rafael Sato...).
Aquele desabafo tão sério, tão importante, tão revelador de
uma menina de nove anos, me fez segurar um riso que estava pronto a explodir,
não por chacota, nem por desprezo, pelo contrário, pois eu senti a seriedade do
assunto...
Prestando muita atenção, depois de ouvi-la com toda seriedade
e respeito, eu a encorajei:
- Hoje você só tem nove anos, são seis anos de diferença que
se faz grande agora, daqui algum tempo não mais, já que as meninas amadurecem
muito mais cedo dos que os meninos, logo, logo, esta diferença de idade não
representará nenhum problema, mas isto, só daqui a alguns anos e quem sabe, se
daqui a alguns anos você não será minha nova sobrinha?
Neste exato momento ela
soltou um riso largo e grato e o meu ônibus chegou...
A vida é assim!
E o amor, quem sabe? Às vezes o amor espera, não na tentativa
branda de esperar, mas se guarda, congela, simplesmente para reacender depois,
quando tiver que ser! É eu acho que assim o amor pode esperar!
Ah, queria amar sempre assim... Feito uma criança! Sem
reservas, sem pressa, sem vergonha, simplesmente amando do melhor jeito, sob o
melhor ângulo: um amor inocente e inofensivo! Amor de criança é assim...
Quanto à menininha: ousada, falante e linda? Vou guardar a
coragem, a seriedade e a inocência dela em relação ao amor... Quem foi que
disse que criança não sabe amar? Pra ela, isto sim, é amor!
Ana Soares
(funcionária do departamento financeiro da FIRP)
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